10/09/2009

Elas

Grita Mayumi em meu peito mudo e desnudo. Vontade de voltar a ser. A ser. A ver. A ter. Sentir. Passando de segunda a terceira, como vós e nós. Nós que já não se desfazem com o tempo. Tempo, Aluap. E choro.


Eu já fui Aluap, e também já fui Mayumi. Ao mesmo tempo. Quando em meus tempos de infância, era permitido ser quem você queria ser. E o que eu queria ser era a rainha do meu quintal.

Desde sempre – acho – subia em árvores e me sentia parte daquilo. Eu era a natureza viva. Mas não a única viva. Mas a que tinha o poder da fala. As árvores e os animais, os anjos e essas duas mulheres que viviam em mim, ou que eram mim, falavam através dos meus pensamentos e eram traduzidos pela minha boca.

E é delas que sinto mais falta. Depois de tanto tempo, recordo. Mas penso que já é tarde.

Mayumi era uma imperiosa índia que adorava correr ao vento. Disputava recordes com os furacões, apesar de nunca se importar em saber quem vencia. Tinha um jeito gracioso de “falar”. E me contava coisas de terras distantes. De mares azuis e cachoeiras impetuosas. Mayumi era uma expressão de liberdade.

Aluap era dominadora, mas gentil. Uma mistura de raças, de cores, de lua. De sol e chuva. Uma amiga que me conhecia. A que mais conheceu. Era também uma sábia conselheira e me guiava pelo coração. Que me emprestava o colo quando eu estava triste e cantava canções de ninar para embalar minha solidão.

Aluap era um pedaço do que eu não tinha. Uma mãe. Era o amor em posse de um espírito sem vida. De um espírito errante que se apossara da minha existência. Era uma rainha. E seu trono era um trançado de galhos da antiga goiabeira. No mais alto galho. E era lá que eu ficava. Aluap reinava. Mayumi acalmava. E o tempo parava. O tempo, Aluap. O tempo Aluap. O tempo...



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